quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Um Homem que também é um número!

Hoje estive resolvendo algumas coisas na rua, sempre bastante atarefado como qualquer professor. Mas, no intervalo de uma das atribuições, abri o Diario de Pernambuco para folhear alguma notícia interessante e particularmente, o caderno de Vida Urbana trouxe uma matéria interessante sobre um homem conhecido como "Vinte Mil".

Por que esse tema num blog de História? Quando falamos em memória, estamos falando de História. Esses dois elementos sempre caminharam juntos em busca de um entendimento maior para a preservação de um povo, um local, uma cultura, enfim. A memória é a mestra das transformações e capaz de tornar um simples fato cotidiano em algo grandioso, dependendo da proporção que toma.

Vinte mil chegou ao HR (para os leigos, Hospital da Restauração) no ano passado, quando sofreu um grave acidente e ficou inconsciente. Depois de dias buscando informações sobre o paciente, os médicos residentes do HR tentaram fazer com que o mesmo se lembrasse de alguma informação que o fizesse se identificar melhor (nome, rua em que mora, data de nascimento, parentes) uma vez que chegou sem nenhum documento. Não conseguindo falar, o paciente apenas pegou a caneta do médico e escreveu, muito pausadamente, o número 20.000 na mão. Desde então, passou a ser conhecido pela única informação que repetia a todo instante: "vinte mil! vinte mil! vinte mil! ".

Veja como a memória é traiçoeira nesses casos. O homem em questão não tem nenhum registro do seu passado claramente em seu presente, parece não saber em que ambiente está vivendo (vive no Hospital há 1 ano e não sai para a rua pois ficaria completamente sem rumo) e não se lembra de ninguém pelo nome, nem mesmo o dele. Os registros mais importantes da História desse homem sofreram uma espécie de arquivamento permanente, onde os médicos não sabem se um dia novamente virão à tona. O mais interessante é como "vinte mil" se relaciona e se refere às pessoas. Quando perguntado sobre qualquer coisa, sempre responde na 3ª pessoa do singular. Informações pessoais também, mas nada que lhe faça referência a seu passado.

Fatos como esse nos fazem preocupar com nossa memória, instrumento tão valioso e tão importante no processo da História de nossas vidas, onde guardamos boas e más recordações, mas também observamos transformações e realizamos analogias sobre "quem fomos" e "quem somos", para buscar um melhor "quem seremos" um dia. A memória de "vinte mil" não foi apagada, mas entrou numa fase de hibernação profunda que fez a História de sua vida tomar outro rumo para, quem sabe no futuro, confrontar-se com seu passado. Até lá, "vinte mil" vive sendo querido por todos e o paciente mais conhecido do HR, sendo inclusive prestativo a todos que por ali passam diariamente.

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