domingo, 26 de setembro de 2010

Caminhando ao contrário

"Nunca fui militante político". Com essa frase, Geraldo Vandré desmitifica sua imagem como grande ícone da oposição artística ao Regime Militar brasileiro. Na verdade, o artista apresenta um perfil que poucos conhecem, ambivalente e ainda repleto de perguntas não esclarecidas pelo silêncio do próprio.

Em entrevista ao Dossiê Globo News, Geraldo Vandré falou sobre os sucesso de "Disparada" e "Caminhando", duas músicas de sua autoria que se tornaram marcos durante o fim dos anos 1960 e início dos anos 1970. Vistas como hinos daqueles que se colocaram contra a Ditadura, o sentido expresso pelo autor nas letras demonstra que havia uma identificação com todas as partes do Brasil daqueles Anos de Chumbo, mas ao mesmo tempo revelava um cantor que não pensava plenamente daquela forma. Obtendo o reconhecimento que procurou, como disse ao jornalista Geneton Moraes Neto, Vandré viveu no exílio desde 1968, teve suas canções vitimadas pela censura e passou a habitar na clandestinidade por muitos anos.

Hoje, vivendo como funcionário público aposentado em São Paulo, aos 75 anos ele revela uma profunda admiração e identificação com os membros da Aeronáutica, chegando inclusive a compor para as Forças Armadas. Segundo o próprio Vandré, os militares nada tinham contra ele, a luta era um engajamento político contra o Congresso, fechado inicialmente em 1964 pelo AI-1 e posteriormente remodelado pelo AI-5 em 1968. Um vídeo na internet mostra ele acompanhando uma apresentação do Sargento Lago em São Paulo onde este canta "Caminhando" aos olhares atentos do compositor, que chora emocionado e depois recebe, ovacionado, as homenagens do público:

Show do Sargento Lago em 09 de setembro de 2008

Buscando a última realização de sua vida, anseia por apresentar canções por toda a América Espanhola, onde diz ter investido tempo e dinheiro num possível retorno aos palcos. Colocando o Brasil em segundo plano, não mostra desejo em cantar pelo país afora, especialmente pelo sentido mercadológico dado à música. O projeto de Vandré gira todo em torno da Aeronáutica, onde dedica a maior parte de seu tempo e produção atualmente, compondo peças sinfônicas para a FAB.

Essa ambivalência no perfil do cantor e compositor se revela na frase "todos os países soberanos possuem suas Forças Armadas". Esta visão revela que o libertador dos anos 60 na verdade tinha uma duplicidade não revelada dentro de si, a qual somente depois da terna idade que possui atualmente teve vontade de assumir. Decorre desse fator o verdadeiro sentido das letras e motivos pelos quais Vandré compôs suas músicas - antes de defender a destruição do Regime, ele ansiava pelo dia em que as Forças Armadas abrissem mão da política e voltassem a ser aqueles defensores da Pátria de antes do Golpe.

Como bem narrou Geneton Moraes Neto: "Geraldo Vandré vive hoje em um país onde existe um homem só - o próprio Vandré". Esquecido, busca nas memórias e nos amigos que fez dentro das Forças Armadas sua razão de viver.